terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Batata Frita e Sorvete III



Capítulo 3 - A Casa Abandonada


Eu estava nervoso e confuso. Meu estômago revirava. Todo esse tempo eu tentei pensar na Ana de uma forma diferente, nas horas felizes com ela. Então Priscila disse tudo o que eu não queria ouvir, toda a verdade nua e crua.
Doeu.
Passei a mão na minha nuca e senti a umidade morna do meu suor já molhando alguns fios do meu cabelo. Caminhei a passos rápidos para longe de minha sala de aula. Não tinha jeito de sair da escola agora, mas havia um lugar onde eu sempre ia para cabular aula.
O almoxarifado.
Tomei cuidado para que nenhum funcionário me visse e fui até meu refúgio secreto.
É, eu tinha sorte. O almoxarifado estava trancado, coisa que nunca acontece.
Esmurrei a porta para descontar minha raiva e saí de lá rapidamente, antes que fosse visto. O bom é que eu tinha um segundo refúgio, mas não era tão confiável: o banheiro dos funcionários. Nenhum funcionário na realidade o usava, porque não era uma das melhores coisas do mundo... Todos usavam secretamente o banheiro dos alunos.
Entrei sorrateiramente no banheiro e me tranquei numa das cabines. O forte cheiro de água sanitária invadiu minhas narinas e me deu vontade de espirrar, mas segurei.
Sentei no chão e coloquei a cabeça entre os joelhos para me acalmar. Eu estava quente, suado e, com o silêncio do banheiro, conseguia ouvir as batidas surdas do meu coração e a minha respiração acelerada.
Fechei os olhos e a primeira imagem que apareceu foi a de uma garota ruiva, sorridente e com uma covinha do lado esquerdo, única e charmosa.


O sítio do meu avô era um dos lugares que eu mais gostava. Mesmo se não tivesse o lago ou os cavalos, eu continuaria amando estar lá. Deitado na grama de noite, vendo as milhares de estrelas no céu. Onde eu morava apareciam no máximo umas três. Aquilo ali parecia magia.
"Sinto ciúmes das estrelas" resmungou uma voz fina e meio infantil ao meu lado.
Sorri com a seriedade daquela frase. Ana era realmente capaz de sentir ciúmes das estrelas, caso ela ache que estou dando mais atenção à elas. 
Virei a cabeça para olhar a ruiva mimada, que estava sentada olhando o céu com um biquinho insatisfeito.
"Seu ciúmes é desnecessário, sabe por que?" me sentei e aproximei meu rosto do de Ana.
Ela me olhou e segurou o riso, para ainda parecer chateada. "Por que?" resmungou.
"Porque eu poderia passar horas te olhando também e seria tão bom quanto." Seu sorriso finalmente apareceu juntamente com a covinha. (Como eu amava aquela covinha!) E seus lábios encostaram nos meus. Sua boca estava fria e me assustei ao tocá-la, mas não recuei. Segurei seu rosto entre minhas mãos e senti seus dedos acariciarem meu cabelo. Ela riu e me empurrou para trás, caindo em cima de mim.
"Eu te amo." foi o que ela disse antes de me dar mais um beijo, um pouco menos frio.
Peguei uma mecha de seu cabelo e coloquei atrás de sua orelha. Olhei em seus olhos por alguns segundos enquanto acariciava seu rosto de leve.
"Até hoje, não amei ninguém assim. Sério, Guilherme, eu te amo muito." continuávamos nos olhando. Era um momento único e que eu não queria que nunca acabasse.
"Eu também." e foi o suficiente para que nós não suportássemos mais a distância entre nossos lábios.
Seu corpo estava quente e na posição em que estávamos eu podia sentir seu coração batendo contra o meu peito. Era uma sensação muito boa e fez com que eu colocasse a mão em suas costas para que pudesse senti-la melhor. Ela reagiu com uma leve mordida em minha boca e recuou.
"Chega, né? Não queremos passar dos limites." disse ela com ar de riso.
Eu discordei. "Que limites?" Tirei-a de cima de mim para me levantar. Peguei sua mão e levantei-a também. "Não temos limites, somos só nós dois."
Achei que ela discordaria na hora, mas ela simplesmente mordeu seu lábio inferior e me encarou séria. Então aquele beijo fora algo mais para nós dois. 
"A casa abandonada" sussurrei para ela, apertando sua mão para lhe dar confiança. 
A casa abandonada era a antiga residência do meu avô, que depois virou a do caseiro e agora é uma cabana cheia de velharias. 
"Ninguém vai ver?" ela perguntou, com a voz meio trêmula. Meu corpo esquentou de ansiedade.
"Seremos só eu e você." prometi
Sua mão apertou a minha com concordância. A felicidade invadiu meu corpo e a beijei, segurando sua nuca com uma intensidade totalmente nova.
E eu mal vi como e quando chegamos a cabana. Só lembro de lá estar quente e empoeirado...


-Aí cara, tá mal do intestino é? - perguntou algum garoto do lado de fora da cabine.
Levantei a cabeça, deixando para trás meu melhor devaneio e respondi:
-Não.
Vendo que meu sossego havia acabado, levantei a abri a porta da cabine. O garoto que me chamara estava lavando as mãos. Pude ver seu rosto pelo espelho a sua frente e então meu estômago revirou de novo.
Era o João, o cara por quem Ana me trocara.







0 comentários:

Postar um comentário